Você já parou para pensar que todas as nossas sensações acontecem no nosso cérebro? Cérebro é vida! A saúde cerebral está naturalmente conectada a capacidade de sentir com qualidade o mundo a nossa volta.
Na escola classicamente se estudo cinco sentidos básicos: Visão, Audição, Tato, Paladar e Olfato. Mas sabemos que existe muito mais, como: Propriocepção/Percepção corporal, Equilíbrio, Dor, Prazer, Sono, Fadiga, Tempo, Empatia, Localização espacial e Temperatura.
Cada um destes sentidos envolve vários órgãos e sistemas, e podem sofre de diversas doenças. Muitas destas são doenças tratáveis com especialidades como oftalmologia (visão), otorrinolaringologista (audição/equilíbrio), psiquiatra/psicológo (empatia, dor, prazer, sono, fadiga), reumatologista (dor, fadiga), etc.
Mas por ser o cérebro o centro para o qual conflui todos os órgãos dos sentidos, é muitas vezes com a avaliação neurológica que seja ao diagnóstico e tratamento mais adequado.
Se uma alteração sensitiva acontece de forma abrupta é muito importante procurar pronto atendimento médico imediatamente, pois pode, por exemplo, se tratar de um AVC.
Veja abaixo mais informações sobre doenças que afetam os sentidos e quando procurar ajuda com neurologista.
Dor Crônica
A dor é o principal alarme do nosso corpo. Quando nosso sistema nervoso detecta que algo no nosso corpo está com problemas e necessita de atenção, é disparado o alarme da dor. E este é um sistema de alarme muito inteligente!
Quando a causa de uma dor não consegue ser tratada, o sistema de alarme vai se ajustando, vai intensificando o sinal (enviando mais dor), vai ampliando o sinal (espalhando a dor), vai gravando o sinal (memória da dor). Assim, nasce e se constitui uma das doenças mais comuns que é a dor crônica.
Infelizmente na medicina não há cura para tudo, talvez estejamos ainda muito longe disso. E existem muitas causas de dor que não conseguem ser resolvidas mesmo com a melhor ciência e tecnologia disponíveis. E conviver com a dor passa a ser uma realidade para muita gente.
Mas existe tratamento! Existe várias medicações, que podem agir, no local de onde parte o estímulo doloroso inicial, nos nervos que transmitem o sinal, na medula que capta e transporta o sinal ou em várias regiões específicas do cérebro que processam desde a sensação pura da dor até a sensação de sofrimento que a dor nos causa. E não só medicações são muitas as terapias integrativas que também são eficazes no tratamento da dor crônica.
Se você tem uma dor que dura mais de semanas, procure uma avaliação sobre dor crônica, as especialidades com mais experiência nesta área são neurologia, reumatologia e anestesiologia.
Dormência e Parestesias
Parestesia é um nome que significa sentir algo diferente do esperado. Como na imagem assim, imagina sentir várias formigas andando na sua mão mas sem ter nenhuma, provavelmente você já sentiu algo assim ao passar muito tempo sentado ou deitado sobre um braço. Todo mundo sente parestesias algumas vezes durante a vida e isto é normal. Uma duração prolongada, ou formas diferentes de parestesias como sensação de choque, queimação, algo andando, ou mesmo sensações indescritíveis, chama a atenção de se tratar de um problema de saúde.
Dormência é um nome mais popular, na medicina chamamos de hipoestesia quando a sensibilidade de uma região do corpo está reduzida. Que pode ser desde sensibilidade nenhuma, até uma sensação como se houvesse um tecido cobrindo a pele reduzindo sua sensibilidade tátil. Também é possível sentir hipoestesias quando impedimos a circulação de uma parte do corpo por muito tempo. A duração prolongada ou início e progressão muito rápidos podem chamar a atenção de se tratar de um problema de saúde.
Mas parestesias e dormências também podem ser sinais de doenças, caso venham acompanhadas de manchas na pele na região acometida, provavelmente trata-se de doença da pele, e um dermatologista ou mesmo infectologista seria o especialista mais adequado.
Mas se a pele está intacta então provavelmente o problema está no sistema nervoso, como a famosa neuropatia do diabetes, mas existem muitas outras. Então caso sinta sintomas assim que não seja muito transitório associado a compressão da região por muito tempo, procure avaliação de um neurologista.
Vertigem, Tontura e Desequilíbrio
Cada um sabe a intensidade da dor que sente, diz o ditado. E é a mais pura verdade, no caso da tontura e da vertigem, é ainda pior! Pois não só a intensidade, mas a forma como o sintoma é sentido é única para cada pessoa.
E pode haver ainda uma combinação de vários sintomas e em intensidades diferentes. Por isso existem tantas palavras para descrever esse problema:
Tontura: Nome popular genérico para mal estar que interfere no equilíbrio
Vertigem: Sensação disfuncional do corpo em movimento, como quando nos sentimos como se estivéssemos num carro, carrossel, roda gigante ou elevador. Ao nos aproximarmos da beira de lugares altos é normal sentirmo uma vertigem!
Desequilíbrio: Quando não temos coordenação motora para ficar de pé ou andar, assim as pernas ficam atrapalhadas.
Fraqueza: Se nossas pernas não tem força, podemos ficar tontos ao tentar andar ou ficar de pé.
Enjoo ou Náuseas: Vontade de vomitar. Muitas pessoas não aguentam parques de diversão, ou pegar um ônibus, pois sentem enjoos.
Desmaio ou Síncope: Às vezes o sintoma vem junto com o escurecimento da visão e fraqueza no corpo inteiro, podendo a pessoa ficar pálida também, podendo chegar a perder a consciência.
Diplopia: Visão dupla. Em alguns casos as pessoas chegam a ver dobrado, podendo até ficar com os olhos tortos.
Dor de Cabeça: É comum ainda esses sintomas serem acompanhados de cefaleia. Sendo a enxaqueca, ou migrânea, a mais comum.
Surdez ou Zumbido: Em algumas pessoas ainda pode acontecer de ficaram sem ouvir bem de um ou dos dois ouvidos, podendo ainda ouvir zumbidos ou chiado ou outros sons, contínuos ou pulsando
Outras: Acontece que quando estamos passando por uma crise dessas, nosso cérebro não funciona bem, assim não conseguimos pensar bem para explicar o que sentimos. Daí existem várias palavras que inventamos para tentar explicar, como: Passamento, piripaque, troço, treco, negócio, zonzeira, pertubação, sapituca, bilolo, oura, etc. Por isso é tão normal utilizarmos palavras assim.
As estatísticas dizem que 1 em cada 13 pessoas costuma sentir tontura com frequência! E, 1 em cada 3 se não sentiu ainda, vai sofrer com isso algum dia!
Cinetose
Algumas pessoas são mais sensíveis a movimentos simples, como girar ou andar de ônibus, passando muito mal. Um problema chamado Cinetose. Talvez dê para dizer que todo mundo tem cinetose, mas algumas pessoas necessitam de maiores estímulos (como giros em maiores velocidades ou de cabeça para baixo) e outras são mais sensíveis, bastando um passeio de ônibus para sofrerem muito.
Isso acontece quando as informações vindas do ouvido interno, nos labirintos, que são órgãos que medem a posição de nossa cabeça, não se sincronizam com informações vindas da visão e dos nossos músculos. Exercícios físicos, principalmente os que envolvem o corpo em movimento e velocidade, como dança, artes marciais, e jogos, como capoeira, podem ajudar bastante. Outra coisa que ajuda é devagarzinho ir se expondo aqueles estímulos para que o corpo vá aprendendo a sincronizar melhor os sentidos nessas situações! Existem várias medicações para tratar estes sintomas também!
Este é um exemplo simples de uma doença benigna que pode dar tontura! Existe várias outras causes benignas de tontura ou vertigem, benignas pois são problemas que não causam morte, mas podem trazer muito sofrimento mesmo assim. Assim existem vários diagnósticos possíveis como VPPB, neurite vestibular, Labirintite, Doença de Menière, Migrânea Vestibular, entre outras, todas com tratamento para controlar os sintomas!
Por outro lado, tonturas podem ser sinais de doenças mais graves, como infecções ou doenças auto imunes no sistema nervoso central, AVCs, Tumores, Epilepsia, Insuficiência vértebrobasilar, entre outras, nas quais uma avaliação especializada pode ser crucial para realizar o diagnóstico e tratamento precoce.
Estatísticas apontam que cerca de 60% das causas de vertigem, são chamadas periféricas, isto é, são originadas no ouvido; Para estas o especialista mais indicado para realizar o diagnóstico e o tratamento é o Otorrinolaringologista. Outras 40% têm relação com nosso sistema nervoso central e necessitam da avaliação e tratamento com Neurologista.
Na prática muitas vezes não é simples identificar a origem dos sintomas, e em muitos casos existe ainda mais de uma causa associada. Assim, uma boa comunicação entre Neurologista, Otorrinolaringologista, Médico da Família ou Clínico Geral pode ser fundamental para juntos se chegar ao melhor diagnóstico e tratamento.
Alterações Visuais Neurológicas
Para ver algo primeiro precisamos de luz, depois que aquela luz chegue a nossos olhos, e que chegue bem numa região dos olhos chamada retina. A partir da retina a luz vira informação, que o nervo do olho leva até o cérebro, que vai organizar esta informação e forma a imagem que vemos de fato.
Uma parte da nossa capacidade de ver, depende do olho, e o oftalmologista deve sempre ser procurado quando se tem uma dificuldade de enxergar. A maioria das doenças que acomete a visão são oriundas do olho e grande parte delas tem tratamento!
Mas várias doenças podem acometer do nervo do olho em diante, são doenças neurológicas que afetam a visão. A forma como essas doenças acontecem podem ser diversas. Podendo ficar faltando um pedaço da imagem, ou mesmo alterações de cores ou da capacidade de reconhecer as coisas (como cores, rostos ou formas), pode até a pessoa ficar sem enxergar direita, ou mesmo nada, e achar que está tudo normal. Tem ainda doenças neurológicas que podem inclusive fazer enxergar coisas que não existem no lugar, como animais ou objetos!
AVC, demências, cânceres ou tumores benignos, enxaqueca, neurite óptica e epilepsia são exemplos de doenças que podem trazer alterações visuais. Se depois de receber um tratamento com oftalmologista ainda está com dificuldade de enxergar, converse com ele se não seria necessária uma avaliação com um neurologista!
Alterações Auditivas Neurológicas
Para ouvirmos algo, ondas sonoras viajam pelo ar e são captadas pelos ouvidos. Depois os nervos da audição levam as informações sobre o som até nosso cérebro, que vai organizá-las no som que ouvimos.
Quando existe uma dificuldade de ouvir, o Otorrinolaringologista, que é o especialista em ouvido, deve ser procurado quando um clínico geral não puder resolver. Mas pode acontecer deste especialista investigar o ouvido inteiro e não encontrar a causa do problema, podendo então ser culpa de alguma doença do nervo ou do cérebro.
Por outro lado, o silêncio total só existiria se não existisse o ar, e mesmo assim poderíamos ouvir nosso próprio coração batendo. Nosso sistema nervoso é que é capaz de organizar e selecionar o que devemos ouvir. E a sensação de silêncio, é uma sensação produzida por nosso cérebro quando estamos num ambiente com pouco ruído e bem tranquilos. Quando este sistema está perturbado podemos sofrer de problemas como zumbidos, chiados, sensibilidade com sons ou mesmo ouvir sons que não existem.
AVC, Demências, Cânceres ou tumores benignos e Enxaqueca são exemplos de doenças neurológicas que podem acometer a audição.
Alterações no Olfato ou Paladar Neurológicas
O olfato é um dos nossos sentidos mais fantásticos, pois ele pode reconhecer substâncias químicas através de uma incrível sensação que é o cheiro! O órgão do olfato é o nariz, e há saindo dele nervos que levam as informações sobre os cheiros até o cérebro, que os organiza nesta sensação que é difícil não se conectar com sensações de prazer, fome ou mesmo nojo.
A grande maior causa de dificuldade de sentir o cheiro das coisas, ou ter um cheiro ruim persistente, é a rinussinusite crônica, ou outras doenças que podem ser diagnosticadas e tratadas por um clínico geral, sendo o otorrinolaringologista o especialista mais adequado.
Mas a situações, como vítimas de pancas graves na cabeça, que podem perder o cheiro por uma lesão na origem do nervo do olfato. Ou mesmo o COVID, que ataca o nervo do olfato em muitas pessoas, podendo trazer um transtorno duradouro. Há ainda doenças neurodegenerativas como Parkinson, que podem afetar o olfato antes que outros sintomas se tornem mais evidentes. Crises de enxaqueca podem ainda ter sensibilidade com cheiros, e epilepsias podem trazer cheiros que não existem.
O paladar, por sua vez, é apenas em parte sentido na língua, nas características de salgado, azedo, amargo, doce, umami ou mesmo picante, como outros elementos da textura do alimento que contribuem no sabor. Por outro lado, aquela parte do sabor que nos permite dar o nome do que estamos comendo faz parte mesmo do olfato! (Experimente comer uma pera cheirando uma maçã)
Então o mais comum é que doenças que afetem o olfato afetem também o paladar. Mas existem doenças na língua, nervos e cérebro que também podem, mais raramente, afetar o paladar.
Sinestesia
O B tem algo amarelo e o 3 é vermelho? Ou que sabe um som macio, uma cor azeda, um sabor quadrado? Já experimentou algo desse tipo? O nome disso é sinestesia. Claro que a poesia também pode alcançar este intuito com suas metáforas, mas há pessoas que de fato sentem sensações cruzadas.
Por muito tempo a origem da sinestesia era um mistério para a ciência, mas hoje já se sabem áreas cerebrais que são responsáveis por este fenômeno. Quase sempre a sinestesia é algo associado ao desenvolvimento natural do cérebro, não sendo uma doença, e muito raramente podendo representar um transtorno como é o TDAH ou Autismo. Na maiorias das vezes permite até uma vantagem por poder explorar de forma mais complexas as sensações. Muitos grandes artistas, como músicos e pintores, possuíam sinestesias.
Contudo doenças que acometam o cérebro nestas regiões podem trazer sinestesias, que geralmente serão mais bizarras e sem padrão definido, podendo ser acompanhadas de dores de cabeça, dificuldades de raciocinar ou crises convulsivas. Nestes casos uma avaliação neurológica será fundamental.
Textos por Hugo Salomão
Fontes/Leitura Recomendada:
- CONTINUUM (MINNEAP MINN) 2021 NEURO-OTOLOGY
- CONTINUUM (MINNEAP MINN) 2019 NEURO-OPHTHALMOLOGY
- Murdin L, Schilder AGM. Epidemiology of balance symptoms and disorders in the community: a systematic review. Otol Neurotol 2015;36(3):387-392. doi:10.1097
- Muelleman T, Shew M, Subbarayan R, et al. Epidemiology of dizzy patient population in a neurotology clinic and predictors of peripheral etiology. Otol Neurotol 2017;38(6):870-875. doi:10.1097
- Golding JF. Motion sickness. Handb Clin Neurol 2016;137:371–390. doi:10.1016
- Osgood, Charles E. “The cognitive dynamics of synesthesia and metaphor.” Cognition and figurative language. Routledge, 2018. 203-238.
- Murray, Ryan. “A review of Synesthesia: historical and current perspectives.” UWL Journal of Undergraduate Research XXIV (2021).